Araguaia, Marechal Floriano, ES, janeiro de 2016

Dia 31/1/2016 passamos por Aragauia, distrito de Marechal Floriano, com acesso pela ES-146, que liga a BR-101 (no acesso a Alfredo Chaves) até a BR-262 (em Marechal Floriano, na altura do Posto do Café). A rua principal é chamada de Rua Caminho dos Imigrantes (que parece ser a mesma ES-146). Existem vários pontos turísticos margeando os dois lados. Lugar bucólico, de tradição italiana, agradável, acolhedor, com opções do que realmente ver!

Placa na rua principal do distrito, indicando a origem da colonização italiana.
Já passei por ali outras vezes, mas neste dia tivemos boas experiências. Queríamos almoçar e já passavam das 14 h. Isto, geralmente significa problemas em localidades pequenas (como é o caso) em especial se a opção for comer em self service. Paramos no restaurante “Oficina da Gula”, já estava vazio e prestes a fechar.
Vista do restaurante a partir da rua principal,. Telhado com telhas cerâmicas esmaltadas e bem feito (mesmo sendo de “uma água” só).


Achei muito aconchegante. Deu para perceber que a comida foi feita com carinho, de uma forma cuidadosa e elaborada. Bem, particularmente gosto muito de vegetais em geral, de boa qualidade. Não sou vegana nem vegetariana! Então algumas coisas me chamaram a atenção:

  •     A salada com brócolis: verdinho, tenro, no ponto. Não estava super cozido nem de cor verde “apagada”;
  •     Salada de alface americana: não costuma ser comum em lugares parecidos. Geralmente encontro as alfaces mais comuns, mais baratas, menos tenras e saborosas.
  •      Purê de inhame: maravilhoso, apesar da linguiça. Muito gostoso.
Acredito que se tivesse chegado mais cedo, num horário “mais convencional”, a comida estaria ainda melhor. Fiquei pensando naquela polenta frita com queijo da roça em cima, um primor. Se tivesse sido feita na hora... hum!
Local onde fica a comida.
A decoração é de bom gosto. “Simples” (o que é algo relativíssimo), com mobília antiga (cristaleiras e outros) abrigando copos e peças de decoração modernas. 

Agora (2017) o nome do restaurante é Estação Araguaya.


Continuando, fomos explorar, a pé, as opções locais.

Visão geral da Rua principal e parte da sinalização.
Empresa que faz o serviço de transporte regular entre Vitória e a localidade.

A Rua Caminho dos Imigrantes (ES-146) margeia a ferrovia (que possui passeios de trem saindo do município de Viana, na Grande Vitória).
Estrada vendo a linha férrea.
Ao longo deste trecho, existem coisas muito interessantes. Vamos a elas:


1. Centro Cultural Ezequiel Ronchi: imóvel de dois cômodos (salas) com outro que os liga. Era a antiga escola de Araguaia transformada em local de exposição (mobília e outros peças que mostra os costumes dos colonizadores) que remonta à colonização e tradições italianas do local.




No interior do imóvel existe muita informação a ser apreciada que resgata partes dos modos de vida que se estabewleceram na região: aspectos da religiosidade, habilidades manuais, mobília, peças decorativas, ferramentas de trabalho, partes da antiga escola original que era o imóvel e muito mais.







































































Chamou-me a atenção os “animais empalhados” cuidadosamente guardados em uma cristaleira. São de tempos mais modernos mas não obtive mais informações da origem destes. Podem ser, todos ou em parte provenientes da região ou de cativeiro. São aves, répteis, peixe e insetos.


Pelo menos um deles ainda figura na lista das espécies brasileiras ameaçadas de extinção: o papagaio chauá Amazona rhodocorytha (papagaio, loro, papagaio-da-cabeça-vermelha, dentre outros nomes que recebe). Ainda não sei se ocorre na área, visto que já foi uma das espécies muito comum de ser criada como animal de estimação e este exemplar pode, eventualmente, ter sido proveniente de alguma residência. 



Outras espécies são, por assim dizer, comuns como anu-branco (Guira guira), algumas saíras, corujas. Espécie menos fácil de ser registrada foi a saracura-carijó (Pardirallus maculatus). Mas no geral, são espécies de áreas abertas, com raras exceções. Provavelmente a grande maioria destes animais (se não todos) vieram da região (sem considerar os possíveis bichos de cativeiro). Sem dúvida uma importante parte da memória da fauna da região e seus costumes. Sugiro a tentativa de buscar os nomes locais regionais dos mesmos, mas não por bibliografias ou “autoridades” e sim pela tradição e conhecimento local tão bem preservado como pude constatar in loco naquele domingo. Não estou aqui abordando as questões legais sobre o assunto, o que provavelmente farei em outras posts.

Lista de animais encontradas empalhados em Araguaia, Marechal Floriano, ES
Local: Centro Cultural Ezequiel Ronchi
Data: 31/1/2016
Documentação: fotos

AVES
FAMÍLIA
ESPÉCIE
Obs.
NOME CIENTÍFICO
NOME COMUM
NOME INGLÊS
Anatidae
 Dendrocygna viduata
irerê
White-faced Whistling-Duck


 Amazonetta brasiliensis
pé-vermelho
Brazilian Teal

Rallidae
Pardirallus maculatus
saracura-carijó
Spotted Rail


Aramides cajanea
saracura-três-potes
Gray-necked Wood-Rail

Jacanidae
Jacana jacana
piaçoca
Wattled Jacana
Adul.

Jacana jacana
piaçoca
Wattled Jacana
Jov.
Cuculidae
Guira guira
anu-branco
Guira Cuckoo

Strigidae
Glaucidium brasilianum
caburé
Ferruginous Pygmy-Owl


Megascops choliba
corujinha-do-mato
Tropical Screech-Owl

Ramphastidae
Pteroglossus aracari
araçari
Black-necked Aracari

Falconidae
Milvago chimachima
pinhé
Yellow-headed Caracara


Falco sparverius
quiri-quiri
American Kestrel

Psittacidae
Amazona rhodocorytha
papagaio
Red-browed Parrot

Icteridae
Molothrus bonariensis
pássaro-preto
Shiny Cowbird


Sturnella superciliaris
flamenguinho
White-browed Blackbird

Thraupidae
Tangara brasiliensis
saíra
White-bellied Tanager


Tangara seledon
saíra-sete-cores
Green-headed Tanager

A lista segue a nomenclatura do CBRO 2015

OUTROS
·         cachorro-do-mato ou raposinha Cerdocyon thous
·         gato-do-mato Leopardus sp.
·         jacaré-do-papo-amarelo  Caiman latirostris
·         jabuti  Chelonoides sp.  (filhote)
·         peixe (não identificado)
·         Instos (várias espécies)

Observação: os animais não estão identificados no local, nem mesmo com os nomes populares.

2.    Casa do Nono: uma construção bem ao lado da ferrovia, que remete aos métodos construtivos do início da colonização. Construída sobre pilotis, as paredes são de estuque, o piso de madeira e o telhado de tabuinhas de madeira. Possui a típica varanda na frente e um cômodo decorado e mobiliado incluindo uma mesa e bancos onde as pessoas se reúnem para jogar baralho, mantendo as tradições dos jogos de cartas.

A bela construção bem no centro do Distrito de Araguaia.


Uma pausa para relembrar os tempos da imigração e colonização dos antepassados italianos.

Detalhes no interior da casa: acima a família representada pelos bonecos de pano (típicos dos tempos antigos) e abaixo os descendentes italianos no tradicional jogo de cartas.
3.    Bocha / bola de massa: ao lado da casa do nono, pessoas se reúnem para disputar, ali mesmo no gramado, partidas de bocha. Pude ver a tradição se mantendo com a mistura de pessoas idosas e outras mais jovens jogando. Quanta explosão de alegria!


4.    Estação Ferroviária Araguaya: sua inauguração é de 1903 (veja em : http://www.estacoesferroviarias.com.br/efl_rj_litoral/araguaia.htm) e segundo o site da prefeitura de Marechal Floriano:
http://www.marechalfloriano.es.gov.br/turismo/29/estacoes-ferroviarias passou por reformas em 2000. Atualmente é um dos pontos turísticos com artesanato para venda e outras informações. Possui banheiros públicos muito bons e modernos. Funciona todos os dias. Neste domingo da minha visita, em particular, estava fechado (o que parece ser uma exceção), mas já o visitei em outras ocasiões.
Detalhes da Estação ferroviária de Araguaya.
5.    Casario: existem as novas, modernas e as antigas. Encontrei detalhes que demonstram cuidados, afeto.

Casario antigo.
Casa moderna com jardineiras na janela.
6.   Bomba de combustível Ronchi: bomba antiga da Texaco super conservada e, ao que consta, no mesmo lugar da instalação original.


7.    Pracinha: espaço ao lado da estação.

8.    Museu Casa Rosa: infelizmente estava fechado. Ainda não foi desta vez que consegui visitar. Disseram-me que vale a pena conferir e me informaram que passou por reformas recentes. Abre aos sábados e domingos.


Casa Rosa: imóvel privado que abre ao público para exibir costumes da época da colonização.
9.    Museu do Esporte: ainda não conheci. Fica ao lado do Centro Cultural E. Ronchi.



É de se destacar a organização, limpeza em geral das ruas, sinalização existente e as pessoas. Aquelas com que tive oportunidade de engatar uma prosa se mostraram com grande orgulho das suas tradições e de onde moram (como a jovem Izabela Uliana Boldrini que nos atendeu no Centro Cultural Ezequiel Ronchi naquele dia) e pude constatar que há participação construtiva colaborativa, por exemplo, na Casa do nono e no Centro Cultural.

Bem, esta experiência não foi programada, mas como valeu a pena! Não basta ter locais bem planejadas sob o ponto de vista de acomodações, mobilidade, arquitetura e demais itens relacionados. Sem dúvida isto é de grande valor. Porém, se aliado a isto as pessoas que ali vão atuar (profissional ou voluntariamente) trouxerem consigo os sentimentos e as experiências recheados de prazer, cultura, modos de vida, história e que estão dispostas a colocar a mão na massa... isto sim, eu valorizo.

Para finalizar, o nome “Araguaya”, segundo o autor Teodoro Sampaio (“O tupi na geografia nacional”, 1987) significa os papagaios mansos e “Araguá” o vale ou baixada dos papagaios. Já na versão do mesmo autor de 1901 (disponível online http://etnolinguistica.wdfiles.com/local--files/biblio%3Asampaio-1901-tupi/sampaio_1901_tupi.pdf) “Araguay” significa o rio do vale dos papagaios. Provavelmente, a origem do nome deste distrito esteja ligado a um atributo faunístico local: papagaios (ou até outras aves desta família, os Psitacídeos: papagaios, periquitos, maritacas...). Neste caso, não seria simples coincidência encontrar o papagaio empalhado acima referido. Porém, já ouvi outra versão, em que apesar de ser um nome de origem indígena, quem deu este nome não foram os índios, mas alguém que estava a construir a estação ferroviária e percebeu ali perto o “divisor de águas” (seria o significado da palavra de origem indígena) entre os municípios de Marechal Floriano e Alfredo Chaves. Não encontrei nada publicado com esta versão, apenas como demonstrei acima, as possibilidades relativas a "papagaios". Então fica aí uma questão a ser melhor investigada.

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